segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

12 de maio (Poema n°04)

O corredor desertou-se – não que ele estivesse cheio, mas a presença de um terceiro já seria demais. O barulho reduziu-se a murmúrios longínquos e nada mais. A luz baixou como se as nuvens estivessem em harmonia conosco.
Distinto da moldura, a forma de seu rosto preenchia-me – estava cego, não fosse por aquela visão. Aquilo – não poderia definí-la como mulher (ou talvez fosse isso uma mulher) – dormia tranqüilo sobre minhas pernas; blasfêmia! Mas o pecado me foi perdoado.
Despido de outros pensamentos – na verdade, eu estava despido de tudo que não era aquilo, os pensamentos não tinham força para afirmar-se em mim, qualquer que eles fossem. As horas passaram magicamente, parecendo apenas alguns minutos (poucos). Poderia ter ficado ali durante dias, semanas inteiras e não seria nunca o bastante.
Ela acordou e quase não pude suportar seu olhar – sua única e simples presença já me era tudo, mais do que poderia ter esperado ou merecido. Ela me tocou; seus dedos eram a prova de existência e o contato com um mundo que até então desconhecia e negava a existência: tal ser só poderia ser de criação divina. Seu toque leve deslizando por mim, em meu rosto lívido, surpreso e estesiado levou-me onde nunca tinha ido, onde nunca fui de novo – até hoje, mais de dois anos depois – e onde acredito não ser capaz de voltar um dia.
Escureceu mais ainda; já era tarde e tínhamos de nos separar.

Um comentário:

Bruno Monlevade disse...

escrito no dia 29 de maio de 2008 e retocado no 15/12/08